segunda-feira, 24 de novembro de 2008

A exceção virou regra

Dados das operadoras de telefonia revelam que os juízes maranhenses autorizaram 971 escutas telefônicas no Estado. Os números estão sendo criteriosamente analisados por especialistas para a identificação de possíveis irregularidades, como grampos determinados por alguma vara que não seja a criminal, uma vez que a escuta telefônica só pode ser usada em investigações criminais.

Está sendo verificado também se foram dadas ordens para interceptações por período superior ao limite de 15 dias, uma vez que é comum se observar grampos contínuos de até 190 dias, sem os devidos pedidos de prorrogação. Não foi possível saber ainda qual foi o número ou percentual de grampos autorizados, individualmente, no âmbito da Justiça Estadual e da Justiça Federal. A maior parte das escutas foi para a investigação de crimes hediondos e de tráfico de drogas.

Os dados das operadoras de telefonia são inéditos e divergem daqueles divulgados recentemente pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que mostrou os números, mas não o relatório completo e muito menos a metodologia empregada. Com eles, será possível saber se está havendo algum descontrole na utilização da escuta telefônica como instrumento da investigação criminal, visto que muitas vezes o grampo não atinge somente o telefone do investigado, mas – em cascata – todos os demais que entrarem em contato com ele, gerando abusos intoleráveis. Para evitar que isso ocorra, o juiz agora é obrigado a deixar bem claro a vedação de interceptação de outros números não discriminados na decisão, que deve ser exaustivamente fundamentada.

Com as novas regras, o juiz tem que autorizar o grampo de acordo com o pedido. Há quem peça pelo número da linha (IMSI - Internal Móbile Subscriber Identifier), mas há quem peça pelo número de série (IMEI - Internal Mobile Equipment Identifier). A esperteza de pedir o número de série é que o usuário pode trocar de chip quantas vezes quiser que o grampo continua.

Os sistemas de escuta só podem ser acionados após o preenchimento de formulários indicando os dados do processo, o número da ordem judicial e demais elementos que respaldem a interceptação. A orientação é para que sejam identificados os técnicos responsáveis pela operacionalização das interceptações telefônicas, uma vez que não há quem não levante a hipótese de que as próprias operadoras possam estar fazendo seus próprios grampos.

Agora, os juízes são obrigados a informar todos os meses à Corregedoria Geral do Tribunal de Justiça a quantidade de interceptações em andamento e o número de ofícios expedidos às operadoras de telefonia. Ao determinar uma quebra de sigilo, o magistrado terá de indicar a autoridade que pediu a medida, os números dos telefones ou nome de usuário, e-mail ou outro identificador no caso de interceptação de dados, o prazo da interceptação, os titulares dos números interceptados, os nomes das autoridades responsáveis pela investigação e que terão acesso aos dados e os nomes dos funcionários do cartório ou da secretaria que manusearão o inquérito ou o processo.

Ao receberem o ofício do juiz, as operadoras de telefonia deverão confirmar com a Justiça os números dos telefones cuja interceptação foi autorizada e a data em que isso deve ocorrer. A operadora indicará em ofício apartado os nomes das pessoas que tiveram conhecimento da medida deferida.

Mesmo com as novas regras para a autorização de grampos, especialistas afirmam que não há garantia de que as informações resultantes de escutas telefônicas estejam sendo mantidas em sigilo, até porque, tecnicamente, o juiz não tem condições de exercer controle no monitoramento das interceptações, não sendo possível identificar os responsáveis por eventuais vazamentos.

Distorções nas escutas telefônicas podem prejudicar diretamente os advogados, principalmente quando estes ficam impossibilitados de ter acesso a íntegra do material interceptado. Como a Policia só degrava a parte que lhe interessa, pode ser que nos diálogos que não tenham sido degravados existam informações importantes que possam, inclusive, comprovar a inocência do réu. O que se conclui é que o grampo – que pela Constituição Federal é uma exceção – virou regra.