segunda-feira, 13 de julho de 2009

Sistema medieval

Nesses quase 21 anos de vigência da Constituição Federal – promulgada em 05 de outubro de 1988 – foram criadas mais de 3,7 milhões de normas tributárias, resultando na edição de 766 regras por dia útil e duas por hora. No período compreendido entre 1985 a 1988 foi editada uma norma tributária para cada grupo de 4.617 habitantes, e no período de 1989 a 2008 uma para cada grupo de 789 habitantes.

Para se ter uma idéia do tamanho da parafernália tributária criada após a Constituição de 1988, cada norma traz, em média, 11,2 artigos. Assim, são mais de 2,534 milhões de artigos, 5,904 milhões de parágrafos, 18,877 milhões de incisos e 2,483 milhões de alíneas. Boa parte desse emaranhado jurídico não serve para mais nada, uma vez que, em geral, cada nova norma revoga outras anteriores.

São normas demais para qualidade de menos. Muitas delas são mal redigidas e servem apenas para confundir os contribuintes, profissionais de contabilidade, e até advogados e juízes, por serem dúbias e de difícil entendimento e aplicação, causando uma verdadeira erupção de sentimento de litigiosidade.

Apesar de, no conjunto, os municípios e os Estados editarem mais normas tributárias por dia, individualmente a União lidera, mostrando que, embora seja muito lenta para cumprir suas responsabilidades, é muito rápida para criar impostos e arrancar dinheiro dos contribuintes, contando para isso com a conivência dos parlamentares, que se especializaram em gastar tempo e dinheiro na elaboração de leis que possam favorecer diretamente o Poder Executivo, que é responsável por 143 das 241 leis produzidas, em 2008, pelo Congresso Nacional.

O dado mostra que a agenda legislativa está nas mãos do Executivo, apesar de na clássica separação dos Poderes proposta, há quase 300 anos, pelo pensador francês Montesquieu, seja tarefa primordial do Parlamento a elaboração das leis de um país, ficando o Executivo com a defesa do Estado e a administração das políticas públicas.

Acompanhar as novas regras tributárias e cumprir a burocracia fiscal representada por inúmeros tributos é um trabalho difícil e caro. No caso das empresas, elas têm que cumprir 3.207 normas tributárias e gastam cerca de R$ 38 bilhões por ano só para fazer o acompanhamento das modificações da legislação, que se afileirada formaria uma extensão de 5,5 quilômetros. São consumidas cerca de 2.600 horas por ano, somente para atender as obrigações do fisco.

O complicado e medieval sistema tributário brasileiro – marcado por gigantescas distorções – foi herdado de Portugal. A Coroa Portuguesa dividiu o Brasil em capitanias hereditárias e sempre utilizou os tributos como ferramenta de dominação.

O mesmo ocorreu no Brasil República, após a Independência. Tributos mais altos possibilitavam que os apadrinhados do Poder fizessem seus lobbies, conseguissem suas benesses e tivessem mais competitividade. A maior parte da população era punida para que fossem criados benefícios para uma minoria.

Infelizmente, isso vem ocorrendo até hoje. O contribuinte é visto pelo Fisco como um escravo e é tratado como um cidadão de segunda classe. Quem é de primeira classe são os burocratas, os políticos que vivem da mamata do Poder Público. As reformas tributárias realizadas até agora só serviram para criar novos tributos, majorar os já existentes e suprimir os direitos dos contribuintes.

Enquanto na Alemanha e nos Estados Unidos se fala em tributos como instrumento de cidadania e desenvolvimento, no Brasil eles são vistos como ferramenta de punição. Talvez seja por isso que as pessoas não pedem nota fiscal e permitem a informalidade e a sonegação.