terça-feira, 31 de agosto de 2010

A ética em questão

Quatro meses após o novo Código de Ética Médica ter entrado em vigor, ainda não se tem uma idéia clara se realmente houve alguma mudança significativa na relação entre médicos e pacientes. Com as 188 normas que passaram a regular a atuação dos profissionais de medicina em todo o país, o novo Código de Ética Médica ganhou dispositivos semelhantes aos dispositivos jurídicos, trazendo expressões que migraram do próprio Código Civil Brasileiro, do Código Penal Brasileiro, do Estatuto do Menor e do Estatuto do Idoso.

Redigido após dois anos de discussão, o novo regulamento é, na verdade, a revisão do código anterior. Muitas cláusulas já estavam previstas no documento antigo e com a nova redação ganharam mais ênfase. É o caso da legibilidade das receitas e o direito do paciente a uma segunda opinião - regras que, no dia a dia, nem sempre são seguidas à risca.

As novas normas, entretanto, trouxeram alguns avanços no que diz respeito a temas que não eram tratados anteriormente, dentre eles a incorporação de regras para reprodução assistida e manipulação genética, além do estabelecimento de limites para a distanásia (morte prolongada, com grande sofrimento, gerada por obstinação terapêutica) e proposição de cuidados paliativos.

O aspecto positivo do novo código é que ele contemplou a sociedade com os avanços tecnológicos e serviu para lembrar o médico de suas obrigações, para evitar dano ao paciente, por ação ou omissão, caracterizável como imperícia, imprudência ou negligência.

Mas, se a maioria das regras já estava em vigor, será que a classe médica está levando a sério o novo Código de Ética? Será que os profissionais de medicina estão respeitando normas básicas como, por exemplo, gravar letra legível nas receitas, fornecer todas as informações referentes à doença do paciente e explicar os métodos terapêuticos disponíveis para o tratamento?

O novo código considera falta grave o médico tratar o paciente sem civilidade ou consideração, desrespeitar sua dignidade ou discriminá-lo de qualquer forma ou sob qualquer pretexto. O profissional de medicina não poderá deixar de atender paciente que procure seus cuidados profissionais em casos de urgência ou emergência, quando não haja outro médico ou serviço médico em condições de fazê-lo. Ele também não pode deixar de obter consentimento do paciente ou de seu representante legal após esclarecê-lo sobre o procedimento a ser realizado, salvo em caso de risco iminente de morte.

Jamais o médico poderá abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu representante legal. Nos casos de doença incurável e terminal, ele evitará a realização de diagnósticos e terapias que não resultem em cura, melhora do quadro clínico, alívio de dor ou aumento do conforto do paciente e proporcionará a ele todos os cuidados paliativos apropriados. É vedado ao médico prescrever tratamento ou outros procedimentos sem exame direto do paciente, salvo em casos de urgência ou emergência e impossibilidade comprovada de realizá-lo, devendo, nesse caso, fazê-lo imediatamente após cessar o impedimento.

Na aplicação dos conhecimentos criados pelas novas tecnologias, considerando-se suas repercussões tanto nas gerações presentes quanto nas futuras, o médico deve zelar para que as pessoas não sejam discriminadas por nenhuma razão vinculada a herança genética, protegendo-as em sua dignidade, identidade e integridade.

Convém ressaltar que as ações para apuração de falhas médicas podem ser propostas perante os conselhos regionais de medicina para as punições disciplinares, ou na Justiça comum, para punição no âmbito civil ou penal, no foro de domicílio do autor. O prazo para propô-las, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor, é de cinco anos, embora o artigo 206, parágrafo 3º, inciso V, do Código Civil, imponha um prazo de três anos. Para eventos anteriores a 11 de janeiro de 2003, o prazo é de vinte anos.