segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Não se esqueça (de votar em mim): porque o 11 de Setembro não é mais uma data livre de política

Por David Weigel
Repórter político da revista Slate

O pânico liberal da semana, agora que a cerimônia de queimar o Alcorão foi cancelada, foi o comício misterioso de Glenn Beck e Sarah Palin em Anchorage na noite de sábado. “Líderes da direita planejam usar o aniversário de 11 de Setembro para ganhar dinheiro”, escreveu Lee Fang do ThinkProgress. “Sarah Palin e Glenn Beck lucram com o 11 de Setembro”, diz a manchete do FireDogLake.

Indignação instantânea, basta acrescentar água – embora diferente de outras do ano, talvez exista alguma indignação verdadeira aqui. Entre o evento de Palin e Beck no Alaska, o lançamento de um novo documentário sobre a guerra contra o terror (“America At Risk: The War With No Name”), um protesto contra o Centro Comunitário Park51 na Cidade de Nova York, e a estupidez feita para a TV a cabo na Flórida, há algo de novo em relação à forma como o aniversário do 11 de Setembro está sendo celebrado em 2010.

Até este ano, os EUA basicamente funcionaram sob a impressão de que a política parava no 11 de Setembro. Em 2008, a campanha de Barack Obama foi criticada por promover um evento para levantar fundos com Warren Buffett que aconteceria no aniversário do 11 de setembro; em público, tanto sua campanha quanto a de McCain reduziram as propagandas na TV. Eles passaram a data num memorial solene no Marco Zero, e foi só.

Dois anos depois, isso parece fora de moda. Em Nova York, o candidato republicano ao governo do Estado, Rick Lazio (sim, ele mesmo), colou sua campanha à disputa sobre a construção de um centro comunitário islâmico a duas quadras do Marco Zero. Sua propaganda sobre o assunto é tão sutil quanto uma bazuca, com imagens de ruínas esfumaçadas do World Trade Center como pano de fundo para sua afirmação de que “os novaiorquinos já sofreram demais”. E ele não falou isso perto da data – como muitos outros políticos que organizaram eventos neste sábado – como se o 11 de Setembro de 2010 fosse um sábado como outro qualquer. Se houve alguma reação, ninguém percebeu.

Como o 11 de setembro deixou de ser um dia sagrado sem política para se tornar isso? Com muito trabalho duro. Durante nove anos, pessoas que apoiavam uma atitude agressiva contra o terrorismo em resposta ao 11 de Setembro trabalharam para garantir sua posse sobre a data. Durante nove anos, elas foram afastadas pela mídia e pelos atores políticos que mais tinham a perder se o 11 de setembro fosse visto como uma prova de que conservadores ultra-durões estavam certos e os liberais ultra-tolerantes estavam errados. E os conservadores ganharam.

As primeiras discussões aconteceram durante a campanha de 2002, quando vários democratas perderam a reeleição para republicanos que argumentavam que seus votos estavam deixando Osama bin Laden feliz, onde quer que ele estivesse. A primeira grande briga aconteceu em março de 2004, quando a campanha de Bush-Cheney incluiu dois segundos de imagens de 11 de setembro num programa eleitoral. Foi a deixa para a indignação. A MoveOn.org pediu que o programa fosse retirado do ar, e reuniu alguns familiares liberais de vítimas do 11 de setembro para defender o ponto de vista. Isso fez com que Debra Burlingame se levantasse de sua cadeira nas páginas do Wall Street Journal. Irmã do piloto do jato que se chocou contra o Pentágono, Burlingame foi atrás das pessoas apresentadas pela imprensa como “familiares do 11 de setembro” de uma forma que ninguém mais tinha a credibilidade para fazer. “Ao maliciosamente se declararem 'apartidários' e insistirem que a irritação [contra a propaganda] é uma questão de 'gosto'”, escreveu Burlingame, “eles detém uma forte arma que aprenderam a explorar em seu benefício. Eles são os 'familiares do 11 de Setembro' e portanto desfrutam do manto de respeito que lhes foi graciosamente conferido pelo público, pelos políticos e, mais significativamente, pela mídia.”

Apesar da coluna de Burlingame, a propaganda de Bush continuou no ar. Usar imagens do 11 de Setembro continua sendo uma boa maneira de um candidato se envolver em controvérsia, normalmente o tipo de controvérsia que o custa votos. Um exemplo: a implosiva campanha presidencial de Rudy Giuliani foi vista como uma prova de que politizar o 11 de Setembro simplesmente não funciona, e sua campanha passou dias denunciando um jantar de fundos de terceiros que pedia para os partidários fazerem doações com final US$ 9,11. A regra quanto à politização do 11 de Setembro costumava ser simples: deixar que os familiares do 11 de Setembro denunciassem qualquer politização durante ou sobre o evento.

Mas isso não acontece mais. Aqueles que apoiam a “guerra no terror”, tal como foi formulada pelo governo Bush, não dão o braço a torcer quando são acusados de “explorar” o 11/9. Eles não têm escolha, veja bem: se usarem o aniversário para defender seu argumento, acabam sendo de certa forma responsáveis por permitir que as políticas de Obama deixem os EUA menos seguros. Quando falei com Burlingame esta semana, ela sugeriu que o fracasso de pessoas como ela ao apontar isso significa que a “narrativa” do 11/9 continuará a se afastar daquela que os americanos endossaram em 2001: a de que havia um conflito de civilizações, e vencê-lo significava pagar qualquer preço. E ela argumenta que a ideia de “trégua” na politização do 11/9 até este ano foi um truque.

“Alguém disse para mim outro dia que foi muito legal que Barack Obama e John McCain tenham parado de fazer campanha no 11 de Setembro” de 2008, diz Burlingame. “Eu dei risada. Sério? Você acha que aquilo não foi político? Foi uma aparição conjunta de campanha! Ambos faziam campanha para si mesmos.”

Burlingame está certa? A trégua na politização do 11/9 é uma politização por outros meios? Se você cutucar os republicanos, eles admitirão que cruzaram os dedos e esperaram um sucesso nas urnas em 2004 e 2006 depois do aniversário. Eles podem até admitir que a escolha da data da convenção republicana de 2004, empurrada para o última dia possível no começo de setembro, foi pensada para aproveitar o momentum do aniversário – com bom gosto, é claro!

Vale a pena voltar até as semanas depois dos ataques de 2001, quando a política supostamente foi congelada. O 11 de Setembro era a data da primária da cidade de Nova York, disputada por quatro candidatos democratas. Os eleitores haviam começado a votar há uma hora quando o voo 175 se chocou contra a Torre Sul. A cidade se fechou; a eleição foi postergada para 25 de setembro. E os candidatos pararam de fazer campanha por votos. “Acabou a campanha”, disse um porta-voz do eventual nomeado democrata Mark Green em 13 de setembro. “Agora teremos uma eleição.”

Talvez esse pensamento tenha sido um dos motivos pelos quais Green perdeu. A campanha não tinha acabado. Ela havia se tornado uma campanha sobre o 11 de Setembro. O prefeito Rudy Giuliani sugeriu a ideia de continuar como prefeito, e Green demorou para rejeitá-la (embora ele eventualmente o fizesse). O rival de Green, Freddy Ferrer, tentou atrair eleitores nervosos prometendo colocar Giuliani num “conselho de recuperação” depois das eleições. Quando Green tentou tocar no “assunto” do 11 de Setembro, ele se queimou – foi ridicularizado por dizer que, se fosse prefeito, poderia ter reunido a cidade como fez Giuliani, e foi atacado depois que Bill Bratton, ex-comissário de polícia que endossou Green, disse que o democrata poderia preparar a cidade para ameaças de terror melhor do que o rival Michael Bloomberg.

Sem nunca ter liderado pesquisas antes das eleições, Bloomberg bateu Green. Olhando para trás, isso parecia inevitável. É muito mais difícil para os democratas fazer a sutil política do 11 de Setembro, porque o aniversário apela para a raiva patriótica e rudimentar à qual só os republicanos prometem responder. É a mesma raiva que levou ao apoio republicano à guerra no Iraque e às músicas de Toby Keith – ou, quando estão desesperados, às músicas de Darryl Worley. E quanto às tentativas liberais de transformar o 11 de setembro num “dia de oração” e tentar (com pouco sucesso) convencer as pessoas de que uma “mesquita no Marco Zero” é OK? Bem, os republicanos percebem tudo isso. Os liberais querem uma “trégua” no 11 de Setembro porque a trégua é a única forma de eles vencerem. Então a trégua acabou.