quinta-feira, 26 de março de 2009

Advogado recebe alvará de R$ 1,00

Por Eucárdio Derrosso
Advogado

Acabo de retirar, numa das Varas do Trabalho de Porto Alegre, um alvará de um real, exatamente R$ 1,00, nem mais nem menos. Ainda bem que o cliente terá direto a outro alvará de valor maior, para compensar essa ridicularidade. Senão vejamos: está certo que esse valor é oriundo de ação trabalhista, direito insofismável do trabalhador, após vários anos de petições, sentenças, recursos e deliberações, agravos, cálculos e decisões.

No caso, o processo é de 2003. É o sagrado direito constitucional do trabalhador. E se originou de penhora on line, (ou depósito recursal?) visto que foram baldados todos os esforços de pagamento espontâneo, ou penhora de bens móveis ou imóveis. Restou, então, esse novo procedimento jurisdicional, a penhora on-line, que é o direito que o reclamante tem de solicitar a apreensão de valor em dinheiro em conta corrente do reclamado, por meio de um simples e isolado ato do juiz, sem ouvir as partes.

Mas vamos laborar em hipóteses ao caso. Por que liberar um alvará desse valor inestimável? Não seria melhor depositar junto a um banco e aguardar os juros? Ou nem receber nem aceitar tal valor? Devolver? Sabe-se que lei é lei, norma é norma. Direito é direito. Cada valor arrecadado deve ser pago em documento separado, próprio.

Direito é direito, repetimos, mas não poderia esse ínfimo valor ser agregado, excepcionalmente, para não se gastar mais papel, assinatura, deslocamento etc a outro documento igual para facilitar a vida de todos? Que falem os jurisconsultos, desembargadores, para o caso ou os legisladores que fazem as leis.

E os honorários, o que restaria dessa singela quantia para o cidadão, se lhe fosses retirados os 20 por cento a quem o advogado tem direito? Alguns centavos a menos poderiam sobejar desse monumental alvará de um real desvalorizado. Ou não? Valeria a pena a luta? Será que Fernando Pessoa se referia a esse epíteto surrealista? Ou seria caso de evocar o processo (não trabalhista) kafkiano?

(Publicado originalmente no site Espaço Vital)